sábado

da necessidade da diferença 1.4


chega de falar de evolução. cansei. escrevo muito pior do que eu gostaria, fica pedante demais pro meu gosto. se alguém (ha-ha) se interessou, procure qualquer coisa dos ótimos Dawkins, (gene egoísta) Dennett (darwin´s dangerous ideia -esse inclusive com um capítulo sobre os desentendimentos de Nietzsche e o que ele achava que era darwinismo, e como na marra ele se mostra mais darwinista que darwin- ou breaking the spell), Pinker (tabula rasa, ou qualquer outro pra saber de linguística) ou Jared Diamond (esse último particularmente foda). Esses sim são bem escritos, sem contar que rigorosamente explicadinhos.
Pros aversos a academia anglófona e suas caretices, aqui tem um artigo sensacional (e fácil) do antropólogo francês Dan Sperber, no qual ele avança inclusive umas idéias bem bacanas sobre a interação mente-cultura.
...
A última coisa que eu queria dizer sobre isso tudo, pra tirar da consciência (ajoelhou...) é sobre mais umas estratégias de sobrevivência que as idéias podem usar. A fidelidade com que um meme se copia é vital para sua sobrevivência. Claro, mudar rápido é bom porque dá mais margem pra novas mutações (aleatóriamente geradas) se mostrarem adaptadas a novas condições, mas se no fim das contas for essas mutações alterarem a idéia além da capacidade de alguém a reconhecer como sendo a mesma, é difícil falar em sobrevivência propriamente dita. Meio como falar que os dinossauros estão vivos, só que a gente os chama de galinhas.
É necessário então algum mecanismo de estabilização dos memes. Na ausência do texto escrito, rimas e ritmo (por exemplo) foram (e são) usadas como uma maneira não só de memorização, mas também de cristalização (de histórias, equações indianas -como Bhaskara- e tradições várias). Você pode lembrar, ou inventar, muitas maneiras diferentes de como Maomé fugiu pra Medina, mas é difícil encaixar qualquer coisa no formato das suras, por exemplo. Ou num mantra. Ou numa prece. Isso não impede que os textos se alterem com o tempo, mas com certeza retarda em muito as mudanças naturais que normalmente se dariam.
E por fim, outra estratégia vencedora seria ter embuído na idéia (talvez uma metaidéia, um esquema mais fundo de manutenção dos memes que habitem uma mente, não sei) um comando pra que seu portador sempre que possível identifique outras idéias como sendo meros derivados (ou variações) dessa idéia. Uma incapacidade de enchergar o outro, de reconhecer a alteridade. O valor de sobrevivência dessa característica seria enorme: quando deparado com uma nova idéia, o portador desse meme seria barrado de dar muita atenção a novidade, ele simplesmente a recordaria como "mera variação" do meme que já tem armazenado em sua cabeça. Isso em contrapartida evitaria a competição pelo tempo (e outros recursos) do portador da idéia com o "leão de chácara" memético.
Pense em quantas pessoas já deixaram de ouvir algo porque evitaram a conversa falando algo como "ah, mas isso é só aquilo outro X que eu já conheço". E quanto maior a capacidade de ver relações entre os memes (quanto mais uma idéia for capaz de explicar, mais outras idéias -e explicações alternativas- ela vai ser capaz de barrar) maior o alncance dessa barreira. Um amontoado de memes (memeplex) que tenha em si esse cabresto é muito mais resistente à competição, e muito mais resistente as mudanças no tempo. Eu não consigo evitar de pensar que isso seja muito comum no meio acadêmico. Versos pré-socráticos, pseudoequações lacanianas, marxismos obscuros são constantemente lembrados como se tivessem alguma coisa a ver com o mundo contemporâneo. Não que as obras estejam limitadas ao seu tempo, mas a diversidade de aplicações que encontram pra essas coisas até hoje me lembra a diversidade de verdades contemporâneas que alguns tiram de textos sagrados, como a bíblia.
Vendo esse livrinho maravilhoso já foi usado como rolo-compressor de tanta variedade mitológica\religiosa\moral\científica é difícil negar o poder destrutivo dessa estratégia de desenchergar a diferença. Em outro lugar eu já disse, mas eu gostei muito de outra vez, muito tempo atrás, quando alguém tentou sugerir que o nirvana budista era o mesmo que o paraíso cristão. O professor respondeu com um sonoro não. Em um, tu se mescla com um deus que é tudo (apesar de só ser bondade, verdade, justiça e amor -muitas contradições), e em outro o sujeito acorda pra revelação de que nada existe, que tudo não passa de uma ilusão dos sentidos pra encobrir o vazio.

Nenhum comentário: