terça-feira

Eu, Itararé: a desconstrução da frase de efeito


1.0 ir pro trabalho acaba com qualquer um

1.1 ir pro trabalho acaba com a vida de qualquer um
1.2 ir pro trabalho acaba com qualquer garçom
1.3 ter que ir pro trabalho acaba com qualquer um
1.4 ir pro trabalho acaba com o dia de qualquer um
1.5 ir pro trabalho todo dia acaba com qualquer um

1.12 ir pro trabalho acaba com a vida de qualquer garçom
1.13 ter que ir pro trabalho acaba com a vida de qualquer um
1.15 ir pro trabalho todo dia acaba com a vida de qualquer um
1.123 ter que ir pro trabalho acaba com a vida de qualquer garçom
1.135 ter que ir pro trabalho todo dia acaba com a vida de qualquer
1.1235 ter que ir pro trabalho todo dia acaba com a vida de qualquer garçom
1.23 ter que ir pro trabalho acaba com qualquer garçom
1.24 ir pro trabalho acaba com o dia de qualquer garçom
1.25 ir pro trabalho todo dia acaba com qualquer garçom
1.234 ter que ir pro trabalho acaba com o dia de qualquer garçom
1.245 ir pro trabalho todo dia acaba com o dia de qualquer garçom
1.2345 ter que ir pro trabalho todo dia acaba com o dia de qualquer garçom
1.34 ter que ir pro trabalho acaba com o dia de qualquer um
1.35 ter que ir pro trabalho todo dia acaba com qualquer um
1.345 ter que ir pro trabalho todo dia acaba com o dia de qualquer um
1.45 ir pro trabalho todo dia acaba com o dia de qualquer um

talvez tenha graça se traduzido em francês

ps. eu sei que no fundo do meu segundo grau de supletivo tinha alguma coisa na matemática que representava isso em números, mas deve ficar menos simples porque a .1 e .4 não se batem. Com certeza eu esqueci alguma combinação

os outros 3

Menina sai do nightbus com celular no ouvido, chorando. Desliga o telefone depois de dois minutos andando de lá pra cá na parada. Com o mesmo movimento que guarda o celular na bolsa, tira um cigarro, mas não acha o isqueiro. Se aproxima de um grupo de três malandros que já estavam de olho. Um deles lhe acende o cigarro. Mais fácil que isso nem pagando.

os outros 2

O grande sanitarista então fez a pausa dramática, concluiria agora sua lição aos alunos mais brilhantes do instituto:
-E gostaria de finalizar revelando uma de minhas maiores descobertas: digo aos rapazes que sempre lavem seus perus após mijar. Pelo menos uma passadinha de água se estiver com pressa. Essencial.
Um dos estudantes não se conteve:
-Doutor, esse procedimento é realmente significativo na saúde dos órgãos sexuais?
-Não, respondeu o Doutor, Pra isso existem preservativos. Lavar seu pau só aumenta suas chances de ganhar um boquete.

o bom gosto


O bom gosto ganhou mais um link. Sá Rodrix e Guarabira pra quem gosta de boa música. Faça um favor pros seus ouvidos e baixe isso agora. Esse outro é uma pérola instrumental do Almir Sater, não consigo pensar em um adjetivo mais adequado do que mágico. Esse só pra quem tem torrent. E bom gosto. Ainda não achei nenhum link confiável do Egberto Gismonti, mas vai rolar. Lógico, Deus nem se discute.

o estrangeiro

antes de vir pra cá li o estrangeiro, do Camus. não gostei. achei uma pusta propaganda cristã, afinal de contas, se a vida de alguém sem valores metafísicos era aquilo, eu prefiro acreditar em deus. a grande pilantragem do livro, que é tentar te fazer simpatizar com o protagonista a despeito dele ter matado o pobre árabe sem motivo algum, é revoltante. o livro pode até ser lido como uma pegadinha, na qual se você for esperto vai ficar constantemente escandalizado pelo narrador, que parece não lembrar que o coitado do árabe morreu por nada.
mais do que nenhum valor religioso, o estrangeiro não tem nenhuma relação com ninguém. a única relação automática que se tem nessa vida é a primeira coisa que acaba no livro: sua mãe, já idosa, morre, e o protagonista não fica muito abalado. claro, é uma pena que ela morreu, mas já era velha, e afinal, todo mundo morre alguma hora. a importância que o estrangeiro dá a morte de sua mãe mais tarde vai lhe custar a vida, martirizado pela sua indiferença e teimosia em ser honesto.
Camus quer dar uma lição de moral, mostrar que os que não se inserem no jogo de mentiras e convenções sociais acabam sendo eliminados pelo sistema. mas não convence. a ausência de propósito que o protagonista vê em tudo curiosamente nunca avança sobre sua própria teimosia em ser sincero. ele não consegue responder à pergunta que aparentemente lhe condena: por que não? claro, por que não não se importar com a morte de mamãe? e por que não fingir que me importo pra continuar livre? se antes da prisão pode-se falar que o protagonista era indiferente a prisão, rapidamente o autor é sóbrio o suficiente pra pelo menos lhe inserir um pouco de desgosto pela cárcere.
o solipcismo egoísta parece ser a única alternativa ao jogo de mentiras da sociedade, e o autor só consegue forjar essa idéia inventando um personagem imune aos outros, armado de uma indiferença que não se limita só às convenções sociais, mas a própria idéia de que o outro é um igual, é merecedor do que o si mesmo gostaria de ter-poder (olha que chique isso, quase uma lacanagem). se a igualdade é uma idéia cristã, abrir mão dela em função de uma crítica moral é jogar o bebê fora junto com a água do banho.
por outro lado, agora que eu sou o estrangeiro (inclusive contando com um enorme estoque de árabes -e poloneses, e espanhóis, e indianos, e irlandeses, infinitos outros- pra matar) não acho a situação tão surreal assim. uma vez que um adulto (cheio de defesas pra se relacionar, que uma criança não teve tempo de apodrecer ainda) é jogado no estrangeiro, os valores e certezas morais dão trabalho de se manter. a indiferença é fácil, porque a certeza da reciprocidade é enorme, é um exercício inútil fantasiar que os outros na rua te acham igual, te acham digno, não te matariam porque estavam com calor e um 38 no bolso.
a diferença entre o estrangeiro real e o protagonista do livro é que a indiferença ao outro é uma projeção (na melhor das hipóteses), ou uma reação (à indiferença real dos outros, um mecanismo de defesa -muitas vezes não só defesa psíquica). desconfio até que seja facilmente remediável. alguns lugares te fazem sentir menos estrangeiro do que outros, e não é preciso muito pra isso. com certeza muito menos do que a teia de falsidades e hipocrisias que Camus tenta criticar.

especialmente pro Gui

Não me pergunte por que, mas cheguei pelo hipertexto em uma série de sites que mais do que interessantes pro modesto apreciador da ginga, do rebolado e do caminhar, imagino que bem usado pode-lhe ser útil na sua colônia de férias -digo, faculdade de educação física. Esse aqui é particularmente bacana, inclusive pra quem não tiver saco pros outros. Saudades puto.

jesus salva vidas


Jesus ama até as feiosas, mas no máximo rola um boca-a-boca.
Mais que isso só com o Diabo.

garçonagens 3

-Do you know how to get to ***?
Me disse o bêbado enquanto eu botava os bancos sobre as mesas.
-Sorry, I don't.
Respondi eu, genuinamente inocente.
-Well, thanks for nothing.
Respondeu o bêbado, às minhas custas fazendo um charminho pra uma menina que o acompanhava.
-Yeah, you too.
Respondi eu, com uma expressão entre o desprezo e o sorriso irônico.
-Touche.
Exclamou sorrindo o bêbado, que afinal tinha senso de humor.

garçonagens: eu e o cara mais interessante do mundo

Outro dia tive uma epifania enquanto polia talheres no pub: pensei no que queria da vida, no que tinha feito até então, e onde eu tinha parado por conta disso. Tentando não ser muito específico pra mim mesmo, pensei nos meus muitos interesses -e como nenhum está sendo satisfeito da forma que eu gostaria. Pensei numa solução genérica pra isso, em uma maneira alcançável de me tornar algo que eu gostaria de ser, e resolvi ser a pessoa mais interessante do mundo. Isso me pouparia o trabalho de ficar reeditando meu CV, de ser desconsiderado por minha formação ser de fora da Inglaterra, e de ter chegado nessa ilha em meio a pior crise desde os anos 70.
Mas afinal de contas, como é a pessoa mais interessante do mundo? Ela tem muitas histórias, provavelmente de viagens. Conheceu diversas figuras notáveis ao redor do mundo. Um senso de humor impecável, só nublado pelo seu timming e bom gosto. Cultura geral, raciocínio afiado e ginga -a pessoa mais interessante do mundo dança bem, como os deuses nietzschianos.
Nesse momento do delírio me imaginei conversando com esse indivíduo tão peculiar. Rapidamente percebi que se tratava de um chato. Não parava de falar, sempre tinha opinião sobre tudo, adorava exibir suas qualidades, não consegui lhe contar uma piada sequer. Não sei se me tratava bem por hábito ou gosto. Evidentemente que a pessoa mais interessante do mundo não era ele, minha idealização futura imperfeita. O que mais interessa as pessoas, o único assunto universalmente popular é o que elas querem dizer, são elas mesmas. Alguém que fosse interessante para todos seria bem mais simples do que eu antes pensara: se trata apenas de um bom ouvinte.
Esse objetivo de repente aparece como bem concreto e familiar. É hora de voltar para a clínica.

Eu, Itararé 2

Encher a cara na night é como usar casaco quando está frio.
Fazer o que?

garçonagens: as reflexões pós double shift

Porque de tédio eu entendo.
Nascido e criado em Brasília, persevero no tédio.
Tédio é diferente de exaustão.
Da exaustão não se cria nada.
...
Porque afinal, ainda não estar bêbado não quer dizer que já não se esteja burro. Pra caralho.
...
Ninguém aqui ouve Beatles.
Camden é uma fortuna.
Johnny Rotten é garoto propaganda de uma marca de manteiga facista.
As negras não necessariamente tem bunda, e rebolam menos que as italianas.
Bunda grande aqui é xingamento.
Os caras devem ter pau pequeno.

garçonagens: psicoreceita

Inventei um joguinho mental pra não me abalar pela trilha sonora do buteco.
Imagino que estou na festinha -não sei de aniversário de 13 anos, ou pior, uma dessas festas desconfortáveis que todo mundo sabe o motivo do porquê mas ninguém fala a respeito. A dona da festa é a Juju. Ela está carequinha e muito pálida (não sei se branquinha ou negra pálida, não sei qual dá mais dó), já perdeu até as sombrancelhas -mas sua mãe as desenhou com maquiagem pra festinha. Juju tem leucemia. O segundo transplante de medula, duas semanas atrás, também foi rejeitado pelo seu corpinho frágil. Juju dança com as amiguinhas, todas terminando a infância, prontas pra entrar na parte da vida que toda menina dessa idade tanto anseia, mas nenhuma mais do que Juju. Ela, por algum motivo que eu ainda não consegui ter claro na minha mente, me considera um convidado de honra, e frequentemente vem ao meu encontro ver se eu estou gostando da festinha. Eu, com um copo plástico de guaraná quente na mão, não tenho como não sorrir e balançar a cabeça. Juju está particularmente orgulhosa das músicas que tocam na sua festinha, passou a semana inteira escolhendo junto às amiguinhas.
É desse jeito que eu me engano pra compreender e aceitar a trilha sonora do buteco. Funciona. Outro dia quase comecei a dançar sozinho.

domingo

inside london vi

o dia de hoje foi assim: acordei as dez, entrei no baú as onze, mas só depois que a máquina de dinheiro me negou dez pounds. conta muito negativada, empréstimo vencendo, sabe deus lá quando entra o meu salário. voltei em casa, abri a porta -surpresa! mas nenhum gringo com minha mulher, é o amor- peguei as moedas do pratinho e peguei o ônibus. 11:10, dez horas atrás estava nesse mesmo coletivo, 134 north finchley pra tottenham, só que voltando pra casa depois do inferno do sábado a noite em carnaby street. black sabbath na orelha, pronto pro fim dos dias. tom jobim só funciona quando tem sol. agora chego em casa, meia noite -hoje terminou cedo- em casa teve um almoção com uma galera, mas pra minha surpresa só me sobrou uma latinha de stella, e isso porque nego foi bróder.
resolução de exilado: ou começo o ano que vem estudando com bolsa nessa porra, intelectual bancado, ou tento a sorte fora dessa ilha de merda. quem sabe até em brasília.