sábado

inside london IV

O garçon menos burro que eu conheci até agora foi um muleque inglês que abandonou o curso de engenharia quando os pais se divorciaram, e usou o dinheiro da bolsa do governo pra fazer cursos de auto-ajuda com um guru americano. Eu descobri isso tentando conversar com o rapaz, que estava latindo aquele KO de que "as pessoas sempre tem uma escolha", e "querer é poder", e derivados. Eu, insistindo na minha inocência, tentei puxar pra uma discussão palatável, mencionando a desigualdade das relações entre as pessoas, a pobreza e a ignorância como barreiras a esses otimismos, etc. O menino se calou. Quando eu falei que ele iria gostar de ler mais sobre essas discussões todas, o ser humano, o livre arbítrio, as condições, falei de sacanagem da santíssima trindade, Marx Nietzsche Freud. O cara não reconheceu os dois primeiros, e emendou falando que Jung era muito melhor que Freud. Interessado, eu perguntei o porque disso. Ele disse que nunca havia lido nenhum deles, mas que sentia que um era muito melhor do que o outro.
Me senti Robinson Crusoe, obrigado a trabalhar pelo sustento de forma tosca, isolado da razão dos homens, cercado por um mar de letargia.

quarta-feira

vazios IV

Surpresas são melhores quando vem do vazio.
O dragão a serpente e a coruja só assustam quando vem a noite.
E só tem graça quando assustam.
Se deus ficasse de bobeira à vista ninguém acreditaria nele.





valeu Gabriel, quase botei um contador no blog.

quality critic 1.3

O primeiro passo na busca de uma justificativa para se escrever é o caráter necessariamente diferente que a escrita tem hoje frente à emergência do hipertexto. Escrever sempre foi um recorte-e-cole de outros escritos, de outras mentes, mas a internet deixou isso escancarado, criando a possibilidade de pontes mais rápidas, menos dependentes da cultura dos indivíduos em um momento prévio ao consumo da obra, e mais escorada na habilidade de fazer recortes e custuras no sistema de informação no próprio momento de degustação do texto. Exemplificando isso, furei uns buracos conceituais na crítica, metendo uns links neles.
A idéia de que o desenho tenha seu valor pela instantaneidade também me parece pobre. O texto pode ser formatado de modo a captar a atenção por algum artifício visual, como os monges católicos e toda a tradição da caligrafia já atestava. O desenho, por outro lado, só teve a separação estrita entre estética e "mensagem", "informacão", "narrativa", "conteúdo" no século XX. Uma corrupção da relação entre conteúdo e forma assola a arte (pós) moderna, que de repente precisa de intérpretes pra ser apreciada. O desenho (pintura, retrato, etc) é a maior vítima disso, já que as outras artes necessariamente incorporam outros sentidos ou necessidades (o texto, além de forma, precisa de conteúdo, sempre é julgado com esses dois critérios em mente; o cinema tem o som, o tempo, a atuação, etc; a música tem também inúmeros critérios, e assim por diante). O empobrecimento da pintura, que nada mais é do que uma distância exagerada entre as possibilidades de interpretação e a obra em si, a necessidade de uma bagagem acadêmica enorme para se começar a desvendar a intenção do autor (ou que, de repente, possa se conceber obra sem intenção) deixam cada vez menos populares as artes plásticas contemporâneas. Estranhamente, existem mais leitores do que nunca no mundo, e inúmeros apreciadores de blogs, em uma realidade cada vez mais afetada por esse sistema de consumo/produção de literatura/saber/crítica. Não que eu desconsidere o problema da infinitude de fontes, e de toda a desinformação existente, competindo pelo mesmo tempo dos leitores, mas 1)eu acho que isso mais ou menos sempre existiu, e se não existiu o modelo de hoje é melhor e 2)sim, isso aqui é bem modesto, sem grandes pretensões. Chame de kafkiano se quiser.

quality critic 1.2

Antes de dizer que eu discordo em quase todos os pontos, eu gostaria de deixar claro que isso me custou um pouco. Ao ler o e-mail de uma pessoa pela qual, além de tudo, tenho um respeito intelectual enorme, primeiro me senti lisongeado. Depois me senti completamente vencido. Como um soldado no front que é rendido por seus superiores, lhe explicando paternalmente que a guerra acabou, e que eles perderam. Eu sei que essa não foi a intenção da crítica, mas foi um dos efeitos que exerceu em mim. Tinha acabado de voltar de uma viagem inspiradora, cheio de idéias novas e ainda sobrecarregado com outras que ainda não articulei aqui, mas de repente, vi a certeza de que a paz e o vazio chegaram, anunciados por um avatar adequado, digno. Torne-se lírico, a chama miúda de umas palavras nunca dissiparão o frio e a escuridão da banalidade e da ignorância.
Mas em uma reação (de novo) bem blog, vou me fazer Armless Johny e continuar. Aliás, continuar sobre o cadáver dos argumentos que tinham me convencido à priori. E quando se quer passar por cima de um cadáver, nada melhor do que firmar alguns pontos nos quais se pisa, afinal, idéias mortas são escorregadias, e tendem a derrubar quem não sabe sua anatomia precisa.

quality critic 1.1

Esse é o ideal do que eu tinha pensado como crítica de blog. Tem uma série de elementos bem blog, como misturar assumidamente histórias da própria vida com o argumento. Mas tem uma idéia poderosa, uma proposta de assumirmos a morte do gênero literário, ou assumirmos a incapacidade de apreciarmos o gênero literário da mesma maneira que idealmente pensamos que no passado ele era apreciado. E não só isso, o raciocínio também invoca uma teoria da percepção da arte, e logo de uma maneira de se fazer arte, muito particular, muito claramente. Separando a apreciação de algo em dois atos, em um impacto (ou ausência de) estético que mais tarde chamaria a um aprofundamento (ou não) da relação com a obra, o consumidor da arte estaria, logo, menos inclinado para se deter nos pormenores do que sequer lhe é distinguível em meio a uma avalanche de sósias. A solução para isso (mesmo que não perfeita) seria se o autor se dispir de qualquer pretensão, e se conformar com a nova realidade do mercado artístico, que aparentemente era diferente no passado por conta de um movimento conspiratório de algum tipo de elite.

quality critic

"...Lendo o seu blog e o do , cheguei a uma conclusão: escrever é ingrato e pretensioso ao mesmo tempo. É ingrato porque quase ninguém lê o que outros escrevem, até porque todo mundo escreve alguma coisa. Se você não possui nenhuma ligação afetiva com a pessoa, ou não a conhece previamente, ou não foi indicada ou algo assim, porque a leria? Se a pessoa tem alguma coisa contra você e sua postura, pior ainda. As pessoas pensam: “ora, porque lerei isso? Ler? Quem esse idiota acha que é para que eu deva perder tempo da minha vida lendo o que ela tem a dizer?” o verdadeiro ato de escrever, meu amigo, deve ser quase como Kafka, que escrevia sem propósito exato, sem nem mesmo conceber fim ou meio exatamente... talvez esse seja o meio menos frustrante de escrever. É pretensioso pelo fato mesmo de você achar que o que escreve é interessante ou útil para existir no mundo e algum letrado se ocupar de ler... pensando nessas coisas, fico feliz de ter abandonado letras e parado de escrever para voltar a desenhar. O desenho resolve todos esses problemas. Você bate o olho, se for bom, você vê mais, se for ruim, você sai fora. Não importa se o cara é velho, novo, engajado, poético, político, filosófico, preto ou branco, se o desenho dele for bom, você olha, senão, você passa reto. As letras, aparentemente, se você não ler o texto, são todas iguais. Você precisa realmente se aprofundar na relação daqueles símbolos para começar a se relacionar com a obra, o desenho está ali, inclusive para os que não sabem ler. No fim, é mais fácil vender um desenho do que um texto, e essa é a triste verdade... agora acho que entendo porque antigamente a elite culta de escritores queria manter a população iletrada... acho que para justamente impedir que polulassem de escritores por todos os lados, e suas obras se perderem em mares de textos enfadonhos... inclusive, manter a escrita longe das massas também ajudaria a manter a “poética” a prosa, a literatura como arte maior, lugar que ela ocupou sobre as outras por muitos anos... porém hoje em dia existem tantos escritores que não conseguimos nem perceber se um é bom ou ruim. Até porque, na pós-modernidade não há lugares para Dostoievisks e companhia..."

orkut II

Desisti do orkut por enquanto. Desisti do orkut como salvação.
Essas depressõezinhas que se pode identificar em alguma coisa, que se podem nomear, não valem nada. Isso é problema, não é depressão. Problema se resolve. Ou se muda de idéia e de repente o que era problema virou solução. Perspectiva mágica. Arbitrariedade da avaliação moral do mundo. Quem gosta de mim mostra como eu sou. Quem me evita mostra como eu sou. Os poucos dos quais ninguém gosta são cheios de alguma coisa feia, e os poucos de quem todo mundo gosta são tão vazios que todo mundo se vê neles.
Depressão mesmo não dá pra ser nomeada, objetificada. Um curto-circuito nos miolos. É só a sensação eterna de querer nada, vazio e triste. O antinirvana.

o melhor do google news 2.1

Pode acreditar Lula. Pode acreditar.
Estranho paradoxo esse de misturar as coisas: o livre-comércio de um lado salvando o mundo, e a esperança em um indivíduo que é o maior obstáculo ao livre comércio de seu país. Afinal, ao meter essa bolada na economia o governo americano está sendo a antítese do livre comércio: evitando que negócios ruíns acabem, seguindo a cruel crença de que existem negócios grandes demais pra cair. Mais estranho ainda é que essa doutrina começou a ser explicitamente exercitada nos states dos anos 80, o mítico período do nascimento do neo-liberalismo, da desregulação, do governo deixando a economia pro mercado. Reagan talvez tenha razão naquilo que ele disse mas não exercitou: The ten most dangerous words in the English language are "Hi, I'm from the government, and I'm here to help." No Brasil pelo menos isso sempre valeu.
Se algum outro nome pro sistema economico dominante for inventado no futuro, existirão rebeldes protestando pela implementação do capitalismo e da mão invisível. Os velhos vão falar que isso não dá certo, e os jovens vão se revoltar falando que quando foi posto em prática, o sistema não tinha mais nada a ver com a teoria que os grandes revolucionários capitalistas tinham pensado, que os capitalistas práticos tinham que se defender dos socialistas que os ameaçavam, etc.

o melhor do google news 2

Estou convencido de que Obama irá resolver os problemas dos EUA, diz Lula


BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta quarta-feira estar convencido de que o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, possa resolver a situação do país, que vive neste momento uma das piores crises econômicas da sua História. No entanto, Lula voltou a criticar a adoção de medidas protecionistas como forma de revitalizar as economias atingidas pela crise financeira mundial.

“Eu estou convencido de que o Obama vai dar conta do recado. Ele está no poder há apenas 20 dias, então a gente não pode também esperar que ele resolva o problema que vem sendo aniquilado ao longo de duas décadas. Eu quero dizer que tenho muita esperança que o presidente Obama possa resolver os problemas dos EUA junto com o Congresso Nacional, junto com os empresários e com os trabalhadores”, ressaltou Lula durante entrevista para imprensa.
Questionado se estaria assustado com o pacote de medidas apresentado pelo presidente democrata, Lula afirmou que não. “Eu não tenho direito de ficar assustado com o pacote do Obama. O importante é que a gente esclareça que são dois tipos de pacote: uma parte é pra tentar salvar o sistema financeiro e a outra parte é pra ativar o setor produtivo. Quem está reclamando é o setor financeiro que parece que não está contente com a parte que cabe a ele”, ressaltou.
Em janeiro, a Câmara dos Deputados dos EUA aprovou o pacote proposto pelo presidente americano, Barack Obama, para tentar tirar o país da recessão em que se encontra desde 2007. O pacote aprovado ficou em US$ 819 bilhões, pouco abaixo dos US$ 825 bilhões propostos por Obama.

Protecionismo

Segundo o presidente Lula, a prática de protecionismo neste momento só tende a agravar a crise. “Eu acho um equívoco as pessoas quererem voltar a praticar o protecionismo de antes. Nesse momento, se as pessoas começarem a praticar o protecionismo a crise só tende a se agravar. Por isso que nós não acreditamos no protecionismo, vamos falar contra, vamos trabalhar contra. E vamos fazer os acordos aonde pode ser feito acordo”.
“Eu estou convencido de que o protecionismo neste instante vai prejudicar a possibilidade da economia voltar a crescer. Eu acho que a melhor medida que os países ricos poderiam tomar neste instante era voltar a sentar na mesa de negociações e concluir a rodada de Doha e dar um pingo de esperança para os países mais pobres do mundo”, acrescentou.
“Eu não posso acreditar, em nome da minha consciência, de que os países ricos passaram três décadas vítimas dizendo que o comércio é uma solução para o problema do mundo, e era só porque eles tinham mais produtos pra vender e estavam nos convencendo a comprar. Acho que agora eles pregaram tanto o livre comércio, que a única coisa que eu quero é que eles pratiquem o que falaram, só isso”.

http://ultimosegundo.ig.com.breconomia20090211estou+convencido+de+que+obama+ira+
resolver+os+problemas+dos+eua+diz+lula+3998978.html


o melhor do google news

Quem não pode mudar o presente, tenta mudar o passado. O bizarro é que nego nem tentou disfarçar o nepotismo estranho disso tudo. Um é filho de outro. Pelé também é santista. Nenhum dos mencionados falou um pio quando o Flamengo (em uma manobra semelhante) quis o seu penta reconhecido.

Santos monta dossiê para "ganhar" 6 títulos brasileiros.

11 de Fevereiro de 2009 13:48

Os santistas mais tradicionais dizem que o time é octocampeão brasileiro. Depois de anos de discussão nos corredores da Vila Belmiro, a diretoria resolveu fazer agir. Com o apoio de Botafogo, Palmeiras, Fluminense, Bahia e Cruzeiro, o time da Baixada preparou um dossiê de 350 páginas para pedir à CBF o reconhecimento dos títulos nacionais disputados entre 1959 e 1970 como legítimos Campeonatos Brasileiros.

Para reunir a documentação, foi contratado o jornalista Odir Cunha. Foram coletadas fichas de jogos, regulamentos de competições, jornais da época e até filmes produzidos pelo Canal 100 para provar à CBF que a Taça Brasil e depois o Torneio Roberto Gomes Pedrosa devem ser reconhecidos.

“É uma pesquisa que conta com a colaboração de outras equipes, mas é toda de responsabilidade do Santos e paga pelo presidente Marcelo Teixeira. O próprio Ricardo Teixeira (presidente da CBF) já disse que se for apresentado um relatório convincente os títulos serão reconhecidos”, afirmou José Carlos Peres, superintendente do escritório do Santos em São Paulo e um dos responsáveis pelo trabalho.

O grande trunfo da pretensão do Santos é uma carta de apoio assinada pelo ex-presidente da Fifa e da antiga Confederação Brasileira de Desportos, João Havelange. “Ele declara que os títulos representavam o Campeonato Brasileiro da época”, revelou Peres.

No dossiê, também consta o apoio de Pelé, assim como depoimentos de jornalistas que cobriram as competições disputadas desde 1959. Se a documentação for acatada pela CBF, Santos e Palmeiras passarão a ser os clubes com mais títulos nacionais no ranking do futebol brasileiro. Os dois terão oito conquistas. O primeiro acrescentaria as Taças Brasil de 1961, 1962, 1963, 1964 e 1965 e o Robertão de 1968 aos Brasileiros de 2002 e 2004.

Atualmente, são considerados “oficiais” apenas os troféus obtidos a partir de 1971, quando foi criada a “versão moderna” do Campeonato Brasileiro. Desde então, o São Paulo é quem tem mais conquistas: seis.

Por causa do apoio, João Havelange deverá receber o título honorário oferecido pelo Santos. O assunto será discutido em reunião do Conselho Deliberativo marcada para esta quarta-feira, na Vila Belmiro.

O debate deverá ser fundamental para que sejam evitados questionamentos a Marcelo Teixeira quanto à campanha do time na atual temporada. Especialmente após a derrota contra o Palmeiras, cresceu o descontentamento de conselheiros com relação ao elenco e à comissão técnica comandada por Márcio Fernandes.

Teixeira pode usar o dossiê como trunfo, já que o reconhecimento dos títulos nacionais obtidos na ‘era Pelé’ é sonho antigo dos torcedores da velha guarda, principalmente conselheiros. “Não tem como fugir disso. São títulos brasileiros e devem ser reconhecidos como tal”, concluiu Peres.

http://br.esportes.yahoo.com/noticias/esportes-santos-monta-dossie-ganhar-6-11022009-25.html;_ylt=Ap_0mkG7BgwKl9LQrUdy.j1w3p14;_ylv=3

terça-feira

orkut

Minha mulher me olhou, disse que eu estava com olheiras que pareciam artificiais de tão escrotas, pretas, fundas e redondas. A solidão, a falta de luz, o frio e a garçonagem estão marcando meu rosto. Outro dia chorei copiosamente vendo os melhores momentos de um jogo vagabundo do São Paulo com um timeco do interior. Chorei copiosamente. Chorei de soluçar. O futebol é o signo do que eu entendo por Brasil.
Estupefato pelo meu próprio estado lamentável, resolvi acabar com os meus problemas abrindo uma conta no orkut. Depois do trabalho, cheguei em casa e entrei naquela porra. Depois de algumas horas revendo as pessoas que eu deixei do outro lado do mar, senti um asco profundo, como são feias essas fotos, como são feias essas pessoas.
Mas depois me voltou a depressão. Fiquei me perguntando o porquê de ter feito tão poucos amigos, de ter abandonado tanta gente pelo caminho, de ter magoado tantas meninas. A vida, no fim das contas, só vale pelas pessoas que você conhece e te conhecem, o que vale é se dar bem com todo mundo. Ser parte da vida dos outros, ter ido naquela viagem, ter aparecido naquela foto da minha formatura. Fiquei pensando nos problemas emocionais profundos que eu devo ter pra ser assim, pra ter dado tão pouca importância pros outros, pra não ter me aproximado mais de mais gente, pra não ter me integrado aos grupos que agora em via em imagens tão felizes no orkut. Rolou quase um começo de delegação de responsabilidade, minha cabeça lembrando uns foras que eu tomei quando tentava ser gentil, umas vezes que foram rudes comigo, quase me vi vítima no meu isolamento.

Até parece.

segunda-feira

inside london III

No metrô ela vê um velho de sobretudo preto sentado na sua frente. Ele leva um buque de flores. Um bêbado fala alto no mesmo vagão. Os olhares se cruzam.
"Belas flores."
"São pra minha esposa."
"Ela tem sorte."
"Essa sorte acaba hoje. As flores são a última alegria que ela vai ter nessa vida. Hoje eu acabo com tudo."
"Ela tem um amante sabia? Ela passa a noite inteira com ele e chega de manhã. Toma um copo d´água e se deita na nossa cama como se tivesse voltado do trabalho. A puta!"
"Dessa vez não, vai tomar o copo d´água e morrer, porque vai beber o veneno que eu pus na garrafa."
"As flores? As flores são pra disfarçar o gosto d´água. O veneno demora um tempo. Ela vai morrer dormindo do meu lado, na nossa cama."
...
"É que eu sou muito sozinho. As vezes compro flores só pra ter o que falar com as pessoas na rua."

domingo

sonho

Me via adentrando o aeroporto de Miami de madrugada. Tudo muito escuro e abandonado, como um pedaço fudido de centro de cidade industrial. Me vi me posicionando no final duma fila onde as pessoas estavam a muito tempo esperando, algumas deitadas em trapos ou sacos de dormir. Quando amanheceu, paguei num guichê a passagem (com meu oyster londrino) que custava $1, e me vi sendo conduzido para uma sala de embarque. Eu era o último a entrar no avião, que era enorme. Tinha a aparencia de um avião normal, mas esticado em sua escala, feito para seres humanos de 3 ou 5 metros de altura. Haviam escadas remendadas aos assentos, que tinham dois andares feitos com tábuas pregadas nas bandejas das poltronas da frente, em gambiarras pra acomodar mais passageiros, que mesmo assim se amontoavam no chão e nas poltronas, enormes como camas de casal. As coisas eram escritas em russo dentro do avião, e eu entendi que era o voo dos sacoleiros que iriam tentar esmolar alguma coisa em Cuba pra vender a mercadoria de volta em Miami.

sexta-feira

Eu, Itararé

"O melhor tipo de trabalho é o trabalho já feito."

Der Wille zur Macht

Talvez seja muito cruel exigir das pessoas que elas ajam de acordo com suas crenças. A capacidade e disposição e vontade de agir de acordo com algo que não necessariamente condiz com o contexto, que não necessariamente condiz com o desejado, que não condiz com o esperado.
Isso se as crenças não forem iguais a de todos os outros, caso no qual elas acabam se transformando no contexto, no esperado, perdendo toda a pessoalidade, toda a originalidade, tendo o seu poder dissolvido na massa.
Porque é poder o que é necessário para ser unico em relação à tentação de ser igual, ser adequado. Poder e vontade. Vontade de poder. Não adianta a visão de como ser autêntico se não existe a capacidade de ser como se quer, se não existe a vontade. Esse ideal morto de si mesmo é o maior segredo da fraqueza, a admissão da incapacidade de se assumir o que se deseja ser.

cretinices 1.3

Mas a resposta que me satisfez perante o comentário do Zé foi mais sofisticada: não é preciso dizer no que as pessoas devem acreditar, porque em grande medida elas não acreditam nas besteiras que dizem crer.
Uma das consequencias de se possuir uma crença é agir de acordo com ela. Seria estranho alguém falar que torce pro Palmeiras mas só usa camisas do Flamengo, só vê os jogos do Flamengo, é membro da comunidade "sou flamenguista e não palmerense" no orkut, e assim por diante. As ações são o maior indicativo de crença, e não o que as pessoas dizem a respeito.
Todo mundo acredita que se locomover com as pernas é melhor do que com as mãos, e ninguém precisa verbalizar isso, é evidente quando se olha uma rua movimentada. Não adianta falar que acredita que as pessoas podem viver de luz se continua comendo. Não adianta falar que Cuba é melhor que os EUA, se a despeito da saúde e educação cubanas serem muito melhores, as pessoas fogem de um pra ir para o outro. Claro, a contradição pode ser resolvida ao se mudar as premissas, como por exemplo, falando que as pessoas que fogem de Cuba são burras, ou traidoras, o mesmo se aplicando a todo mundo que ainda não se mudou pra lá.
Por isso eu me tranquilizo quando ouço alguém falando seriamente que tudo é relativo, ou que não existe realidade objetiva. Claro. Assim que você fala que tem uma filmagem do namorado(a) dessa ilustre figura intelectual trepando com outra pessoa, todo o relativismo moral desaparece, como se nunca tivesse existido (o que de fato é o caso). Como uma vez me disse um primo bêbado, você só descobre se não acredita em jesus cristo quando te metem uma arma na cabeça e você não reza. Ou inversamente, quando você acredita na sua filha falando que é virgem e está grávida, mas que foi o espírito santo que a embuchou.

cretinices 1.2

E independente disso tudo, a própria asserção de crença geralmente é vazia. Afinal de contas, o que significa dizer que se acredita em algo? Acredito que minhas ações tem reações iguais e em direções opostas. Isso permite que as pessoas joguem sinuca, martelem um prego na parede, nadem na água. Igualmente, isso faz com que as pessoas não gostem da idéia de martelar um prego no próprio olho, usem um taco pra jogar sinuca ao invés da própria língua, e usem os braços e pernas pra não se afogar, ao invés do poder do amor universal que habita seu coração.
Mas uma corrupção moral da terceira lei de Newton faz com que as pessoas acreditem em karma. Acredito que sendo bom, coisas boas vão acontecer comigo. Não só as pessoas vão me recompensar por ter sido bom com elas, coisas inanimadas vão me favorecer por eu ter sido bom. Claro, isso funciona porque coisas boas e ruins acontecem o tempo todo, e a causa de algo tem que ser encontrada no mundo. Isso leva nego a ignorar as causas físicas e atribuir motivos morais pra realidade ser como é. Choveu porque eu menti pra minha avó. A impressora não funciona porque eu fiz o trabalho em cima da hora. Ganhei na raspadinha porque dei uma esmola pro mendingo.
Claro que crenças idiotas cada um tem as suas, e isso resulta no estranho fenômeno de contradições em como o universo deveria recompensar as pessoas pelas suas ações morais. Choveu porque eu menti pra minha avó, mas e se eu escondi dela o fato de eu ter câncer pra poupar a velhinha que está na UTI e não pode ter emoções fortes? E se eu só fiz o trabalho em cima da hora porque tava ocupado como voluntário de alfabetização de crianças carentes? E se dar esmola pra mendingos na verdade piora a situação deles porque é um desistímulo a sair dessa vida e procurar um trabalho de verdade?
A mente humana tem problemas com a aleatoriedade. Probabilidade é um inferno de aprender não porque seja muito difícil, mas porque contradiz um monte de coisas que são muito enraizadas (na nossa cultura? na nossa mente? não sei). Afinal de contas, a moeda que caiu cinco vezes seguidas em cara tem uma chance maior de dar coroa na próxima jogada, diz o senso comum. Quando não se encontra uma causa física (ou não se quer encontrar...), o jogo da realidade moral começa, e até pessoas educadas começam a latir sandices que funcionam porque ninguém questiona.

cretinices 1.1

Então, baseado num comentário do Zé, no qual ele sabiamente me disse "deus me livre de falar no que as pessoas devem acreditar", me vieram a cabeça algumas respostas. Primeiramente, claro que o bacana é a gente ser liberal e reconhecer a liberdade dos outros pensarem e falarem o que eles quiserem. E isso quer dizer que nós reconhecemos o direito das pessoas pensarem e falarem coisas que nós odiamos, achamos uma merda, nonsense, etc. Afinal, Stalin e Hitler e o Ai-5 davam toda a liberdade do mundo pras que as pessoas pensassem e falassem de acordo com o que eles achavam certo. Tolerância necessariamente quer dizer tolerância com o oposto.
Mas fica um gostinho amargo no canto da boca. Eu não sei de onde vem essa necessidade de estar certo, ou de pelo menos encontrar algo que esteja certo, e dessa coisa que é certa ser uma só, não contraditória consigo mesma. Olhando rápido parece de novo o pré-socratismo, mas essas relações são tão poderosas, tão enraizadas na natureza humana, tão abundantes na natureza, que mais parecem um princípio da realidade. (e faça-se o favor de não tentar invocar nada que tenha a palavra quântico pra contradizer isso. ninguém sabe exatamente o que essas coisas querem dizer, e muito menos se isso exerce algum impacto na nossa vida. basta dizer que Newton ainda é mais usado que qualquer coisa pra se construir na nossa escala até hoje).

terça-feira

Cretinices

Uma série de clichés intelectuais que eu odeio, e acho uma prova formal de burrice falar em voz alta sem estar de sacanagem:
- Tudo tem um lado bom e um lado ruim.
É? Qual o lado bom do estupro? Qual o lado ruim do ser humano ter duas pernas? Qual o lado bom da censura?
- Ciência é uma crença igual qualquer outra.
É? Quando você quebra o braço, qual outra religião você procura pra resolver seu problema? Quando você quer atravessar 30km no mesmo dia, pra que outro santo tu reza? Qual princípio karmico você invoca quando quer tirar uma cópia de um texto?
- Deus.
O que diabos as pessoas querem dizer quando latem essa palavra? Essa é a pergunta que mata deus. Assim que nego tenta definir o que pensa como deus, energia superior, amor universal, e pensa nas implicações dessa porra ser real, o mundo sempre dá contra exemplos. Deus é bom? e a tsunami? Deus pode tudo? pode fazer uma pedra que nem Ele consiga levantar? Energia superior...? querendo dizer...? Aí, quando nego fala que não dá pra desprovar qualquer que seja a merda que acreditam, pode-se responder: sim, e também não dá pra desprovar que o senhor do universo e lorde da vontade alheia seja o Sérgio Malandro. Ou eu. Ou o cachorro que acabaram de atropelar porque deus tava tirando uma soneca.


alzheimer prevenction project II

Tenho uma série de idéias na cabeça esperando a sistematização. Direto isso acontece, e o descaso com a fugacidade da inspiração muitas vezes deixa a ilusão da constância que nunca vem. Hoje não. Como se fosse um prólogo dos pensamentos porvir, como um trailer cognitivo, as anotações vão tomar um espaço maior nesse antro de agora em diante. Foda-se o polimento formal da academia e das escolhas de palavras. Fodam-se as lacunas lógicas ou as introduções. O hipertexto está aí pra isso, e a dificuldade de se entender um enigma é recompensada pela satisfação de se ter mais uma faceta mal finalizada do prisma da minha mente.
Ultimamente os pensamentos me vem com sombras que os conectam, ofuscando quase o suficiente de seus limites para dar origem a um grande quadro sobre o que eu vejo. Um mapa de razões sobre o mapa de percepções, ambos na esperança de se sobrepor sem muitos rasgos sobre a realidade.

paródia do zé

Máquina no cabelo, corte novo.
- ... vou tomar um banho então.
- Espera. Eu vou primeiro.
-Por que?
-Quero trepar contigo direto depois que você sair do seu.