domingo

da imprensa ii

Não é acidente que a chamada "grande mídia" brasileira esteja em franca decadência comercial (e nunca tenha sido muito grande, pra começo de conversa). Um dos motivos pra essa queda é a idéia de que um veículo com peso nacional em políticas do governo é funcionalmente incompatível com um jornalismo que apele ao consumidor que não compartilha as idéias do editor. Em outras palavras, ou você fala sobre o totalitarismo latino e a mudança que a China causa no capitalismo ou você fala sobre a manifestação dos professores do Paranoá.
Não é uma questão de diferença de complexidade (até porque a grande mídia no Brasil consegue falar idiotices bem simplórias sobre economia mundial), mas de escala. O espaço/tempo/recursos para notícias locais (em jornal, rádio ou tv) compete com as notícias nacionais ou globais, e quanto mais ênfase nos aspectos locais, menor o interesse do consumidor distante, daquele que não tem grandes interesses naquela comunidade específica. Mesmo se todo cidadão que habita o Paranoá comprasse o Diario Paranoaense, e mais o dobro disso no resto do país, a tiragem ainda assim não teria a penetração que a grande mídia tem hoje.
As notícias nacionais, por sua própria natureza, não podem se aprofundar na concretude do cotidiano (do Paranoá) sempre. Uma ou outra reportagem pode usar essa comunidade como exemplo de uma questão mais geral (como o ensino público no Brasil), mas se assim fosse sempre, não só o resto do país não se interessaria tanto, mas a própria idéia de que se trata de algo importante nacionalmente seria posta em questão.
Essa dinâmica da reportagem nacional traz o agravante de que para a notícia ter relevância nacional ela pode ou 1. ser uma questão que assola uma parcela considerável da população inteira ou 2. ter a importância para afetar essa mesma população. O tamanho do Brasil deixa muito difícil apurar qualquer que seja o assunto em termos nacionais a tempo de se produzir conteúdo com a frequência (e em tempo real) que um jornal, tv ou rádio precisam. A única alternativa é reportar o que se considera importante o suficiente, sendo impossível outra justificativa que não o julgamento de alguém que decidiu essa importância.
Esse filtro ideológico no que a grande mídia vai reportar é complementado ainda por como a reportagem vai ser abordada, mas mesmo que não fosse, o estrago já estaria feito. Mesmo se a corrupção na receita federal fosse abordada de todos os ângulos possíveis, a escolha em abordar esse assunto (e não a educação no Paranoá) já revela um filtro que elimina o que é mais útil na idéia de um veículo de notícias, que é informar o consumidor sobre os assuntos que o afetam no dia-a-dia.
A objeção de que (por exemplo) e receita federal na verdade tem uma série de conexões que acabam resultando em algo que influencie a escola no Paranoá é pífia: tudo está conectado a tudo, qualquer um consegue pensar em notícias do outro lado do mundo que acabem influenciando os professores do Paranoá, mas porque se dar ao trabalho disso tudo se o jornal pode simplesmente falar sobre a escola em si? E como ele não fala, não é surpresa que o cidadão não se importe muito com o que o jornal veicula.

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